O terceiro princípio andragógico, segundo Knowles, explica o papel que desempenha a experiência de uma pessoa em sua aprendizagem, o que será endereçado neste texto.

Este artigo faz sequência à série de textos sobre os princípios andragógicos de Malcomn Knowles, e você pode encontrá-los individualmente nos links a seguir: 


Vamos agora ao estudo do próximo princípio.

Princípio #3: A Experiência do Aprendiz 

Conforme já observamos, adultos costumam ter um histórico de experiências muito maior e complexo do que as de uma criança. Partindo dessa suposição, podemos crer que adultos assimilaram e construíram um sistema de crenças mais solidificado. Esse entrelaçado de crenças, valores, narrativas e construções se configuram em - usando a linguagem rogeriana - um esquema bastante solidificado na mente adulta - razão pela qual alguns adultos podem ser menos adaptáveis do que crianças quando se trata de situações que ameaçam sua cosmovisão. 

Por isso, um adulto dificilmente recebe e assimila "verdades" externas de maneira passiva e inerte, assentindo intelectualmente a elas. Ao contrário, o adulto as valida ou repele conforme sua congruência ou dissonância em relação às conclusões que já tenha construído. Em tempo, certamente um adulto, quando tem suas conclusões prévias confrontadas por grande quantidade e qualidade de evidências contrárias, pode sujeitar-se a um processo de adaptação, mudando suas categorias para aprender algo completamente novo. Mas, sendo o processo de adaptação mais dispendioso do que o processo de assimilar novas informações, é mais provável que uma pessoa adulta passe todas as novas informações por um filtro complexo de esquemas mentais. Desse modo, as experiências de um adulto direcionam uma atitude de cautela ou até mesmo de antagonismo diante de novas informações que cheguem com impulso unilateral. Um adulto precisa ser posto como protagonista e criador de sua própria aprendizagem; ele precisa construir as próprias conclusões.

Implicações deste princípio para ações educativas

  • Primeiramente, o designer de educação deverá projetar experiências e atividades que envolvam o aprendiz e valorizem suas experiências. Novos conhecimentos não devem ser compartilhados de forma unilateral, do trainer para os aprendizes: uma vez que cada pessoa tem seus próprios filtros e conclusões, é imperativo que essas experiências sejam elicitadas pelo mediador da aprendizagem, e que sejam articuladas como peças de um quebra-cabeças de informação que vai sendo montado em tempo real.  
  • Em segundo, e como ponto geralmente esquecido, tanto o designer da aprendizagem quanto o mediador e trainer precisam ter a competência da empatia relativamente bem desenvolvida. Empatizar significa, antes de sentir com o outro, ser capaz de suspender seus próprios juízos de realidade e de valor, e posicionar-se com mentalidade de abertura e receptividade a novas ideias. Apenas quando estamos abertos a possibilidade de estarmos errados ou de não sabermos tudo sobre um certo tema, conseguimos adotar uma dose madura de agnosticismo, de suspensão dos julgamentos e de inclinação para considerar a visão do outro como uma hipótese para a realidade, ainda que temporariamente. Essa competência é que possibilita a disposição empática com o outro. E uma vez que o conhecimento deve ser construído em conjunto, tendo as experiências dos aprendizes como matéria prima, segue-se que a empatia do mediador torna-se necessária para que se receba as construções de mundo dos aprendizes, e as use como materiais para que se chegue ao conhecimento numa ação educacional.

Desafios especiais da área de aprendizagem, a partir deste princípio 

  • Acima de tudo, o departamento de aprendizagem precisa ser capacitado nos próprios princípios andragógicos, para que consiga instrumentalizar este princípio. Apesar de auto-evidente, esta dica é, em geral, negligenciada. Frentes de aprendizagem ainda costumam entregar soluções que satisfazem a demanda verbal por "treinamentos", mas não geram valor por meio deles com resultados reais. A negligência deste princípio têm sido a causa real dos resultados enfraquecidos das frentes de T&D.
  • Considerar as experiências dos aprendizes não equivale a suprimir a entrega de um conteúdo previamente acordado e definido. Significa, antes, colocar as experiências dos aprendizes como caminhos para se chegar ao conteúdo necessário. Ao mesmo tempo, a mediação deste processo precisa ser afiada o suficiente para adaptar ou até mesmo rever conteúdos em tempo real. Este é um dos princípios que mais apontam para a necessidade vital de uma boa mediação da aprendizagem como fator de sucesso do projeto. 

Segredos especiais e ninja hacks ligados a este princípio

  • Uma das formas mais eficazes de se construir novos conhecimentos é conectando-os com os que já se sabe sobre determinado assunto. O designer da aprendizagem ou trainer, caso não sejam a mesma pessoa, podem valer-se de instrumentos de diagnóstico inicial para acessar o conhecimento dos aprendizes sobre o tema ou sobre correlações com o tema. Isso servirá ao propósito duplo de (I) potencializar a aprendizagem dos participantes pela autoconsciência sobre o tema, e (II) munir o designer com inteligência sobre as experiências prévias dos participantes, para que possa conceber atividades, exposições e demais instrumentos didáticos que conectem as experiências prévias do público aos conhecimentos novos que serão trabalhados.
  • Metodologias ativas na arendizagem de adultos (discussões em grupo, resolução de problemas, estudos de caso, simulações, etc.) costumam trazer precisamente esse elemento que ajudam os aprendizes a buscarem suas experiências como combustível. Existem várias opções de metodologias ativas. O designer deverá ser capaz de analisar o cenário para escolher qual poderá ser a melhor para cada momento no projeto.
  • Um hack de valor especial é: escolha uma forma de avaliação educacional que, legitimamente, avalie se um objetivo de aprendizagem foi cumprido, e não se um certo conteúdo foi transmitido. Novamente, parece ser uma ideia auto-evidente mas é muito comum que haja uma confusão entre essas duas instâncias: objetivo de aprendizagem versus conteúdo programático. É preciso manter em perspectiva a distinção conceitual entre ambos. Embora sejam ideias interligadas, dentro dos quais a segunda está sujeita à primeira, são conceitos diferentes. Essa diferença é muito importante porque, dentro do princípio em análise, em geral, a forma de mediação importa mais do que o conteúdo transmitido. A avaliação sempre deverá estar focada em verificar se um objetivo de aprendizagem foi atingido, e não se um certo conteúdo foi memorizado pelo aprendiz - a não em casos específicos nos quais o objetivo for a memorização. Os instrumentos avaliativos precisam ser muito bem elaborados para que mostrem a informação certa. O designer educacional precisará colocar a devida atenção na hora de projetar suas avaliações.


Conclusão 

Este foi o terceiro princípio andragógico, conforme Knowles. No próximo artigo visitaremos o quarto princípio do educador americano.